Prédio do condomínio de casal LGBT que foi obrigado a retirar cortina com as cores do arco-íris (Foto: Reprodução/Vice)
Esta é uma pessoa anônima. Seu nome existe, mas não é importante para sua história. É uma pessoa de orientação homoafetiva. Ou, no popular, gay. Mas representa todas as identidades inclusas na sigla LGBTQIAP+. Ela compartilhou com um dos envolvidos a seguinte história. Uma parte da sua vida.
Foi criada dentro da igreja. Não somente criada. Aquele local era sua segunda casa. Era seu ponto de referência. Fazia parte de sua identidade. E não estava sozinha. Sua mãe tinha participação ativa nas atividades.
A partir de certo momento, a orientação homoafetiva surgiu. Ela não detalhou como que as pessoas da comunidade a identificaram. Mas perceberam. Não era possível esconder sua identidade LGBTQIAP+. O padre também ficou sabendo.
Será que a mãe, com preocupações habituais, buscou orientação naquela igreja? Para compreender que universo era esse, desconhecido para ela? Ou buscou para saber se havia algum pecado em pertencer a ele? Quem sabe buscou para participar da luta do seu filho pelo direito de ser feliz?
Qual seriam os textos bíblicos daquela missa? A data do calendário litúrgico? Cada dia tem passagens bíblicas pré-determinadas, que inspiram o sermão. Houve um que foi duro. Por alguma razão o padre o olhava nos olhos (sim, ele estava tão em casa que ficava próximo do altar). Enquanto lhe fitava as pupilas, com sua autoridade, ensinou: tem demônio! Pessoas LGBTQIAP+, endemoniadas que são, pecam! Quanto maior a duração da vida, maior a quantidade de pecados. Talvez para abreviar o tempo de purgatório, ou escapar do fogo do inferno, seria melhor que a vida fosse curta.
O pároco não estava sozinho. Quem o ouvia demonstrava crença no que escutava. A cada afirmativa, balançar comunitário de cabeças. Será que constrangidas? Sofridas? Solidárias com o destino pintado a partir do púlpito?
A situação estava bem clara. O diagnóstico estava feito. O tratamento… Bem, não estava na prédica. Mas esta permitia uma única conclusão. Se o demônio era o culpado daquela identidade… Se habitava aquele corpo…
Saiu da igreja com o endereço certo na mente. Aquele prédio com quase 20 andares fornecia uma altura adequada. Que corpo sobreviveria à queda? Decidido o tratamento, marcar a data. Neste dia, bilhete dirigido à família na mochila, se pôs a caminho. O que a carta dizia? O que eu teria escrito?
O amigo foi encontrado no ônibus. Um convite saiu do nada:evento na PUC. Como o dia era longo, a universidade no caminho, foi conferir. À tarde um padre iria falar. O tema, parece que caiu no esquecimento, porque deixou de ser importante. Criado na sacristia, ouvir um sacerdote naquele momento de cura parecia adequado.
Seus olhos não foram buscados pelos olhos do palestrante. A fala não lhe era dirigida. Mas foi como se fosse… Não havia pecado a apagar! Não havia diabo a exorcizar! Não havia razão pela qual morrer!
Qual o destino do bilhete? Desconhecido. Será que algum dia passou por aquele prédio?
Entrou em contato com aquele Sacerdote – sim, com S e não com s. Contou sua história, esta história. Que incentivou uma militância.