Uma pessoa destransicionar é ótima manchete para determinados meios de comunicação. Para seus leitores, é um chamariz para um assunto quente, palpitante, da hora.
É um momento em que a transfobia pode se materializar sem ser óbvia. A repulsa ao gênero diferente daquele ditado pela cisnormatividade tem oportunidade de se expressar travestido de matéria jornalística de cunho informativo.
Pesquise na internet “transgêneros que se arrependeram”. Investiguei no momento de redação deste texto e o google me devolveu aproximadamente 11.700 resultados. Os textos na primeira página:
Os vídeos disponíveis na primeira página:
Os títulos dos textos, sete no total, usam o verbo arrepender em três; um sugere arrependimento sem utilizar o termo; outro diz que transcionar não cumpre a promessa de melhorar a saúde mental; outro que ser trans é comportamento de adolescente rebelde. Apenas um tem aparência de neutralidade, informando que há um debate vivo sobre a questão.
Os títulos dos vídeos usam sempre o arrependimento como tema central.
Entre os dez atalhos que apareceram na minha tela na busca, apenas um, o primeiro, é explicitamente de caráter informativo. Um outro levanta uma questão pertinente. Qual educação os 80% restantes prometem trazer?
Se transfobia for compreendida como o ódio, repúdio ou medo de contato com pessoas transgêneras, que leva a incapacidade de admitir a existência delas, apresentando-as como pessoas moralmente rebaixadas, os 8 atalhos restantes se encaixam na definição.
Desejo de desfazer a transição existe? Sim.
Desejo de desfazer a transição é frequente? Não.
Por que pessoas desejam destransicionar? A literatura médica levanta algumas pistas, que não aparecem nas mídias populares:
Na minha vivência profissional, encontrei 4 pessoas que não se perceberam mais enquanto transvestegênere. Suas motivações: extrema opressão física, psicológica e financeira; abuso religioso; não informada.